Noivo Neurótico, Noiva Nervosa
Por Sandro Massarani
Nome: Noivo Neurótico, Noiva Nervosa
Rating: 9/10
Nome Original: Annie Hall
Ano: 1977
País: Estados Unidos
Cor: Colorido
Duração: 94 min.
Dirigido por: Woody Allen
Escrito por: Woody Allen, Marshall Brickman
Estrelado por: Woody Allen, Diane Keaton, Tony Roberts, Carol Kane, Paul
Simon
"La-di-da, la-di-da, la la"
Enredo:
Inseguro escritor nova-iorquino inicia romance com mulher tímida e também
problemática que deseja ser cantora. O enredo é pano de fundo para piadas,
diálogos inteligentes e situações inusitadas que volta e meia preenchem a vida
humana, sendo uma espécie de semi-biografia de Allen, ainda que de forma
diluída.
Histórico:
Em 1977, Woody Allen já era bastante popular, principalmente nos círculos nova
iorquinos, cidade onde nasceu. Desde a adolescência, Allen foi conquistando
seu espaço escrevendo piadas, colunas, tiras de quadrinhos, peças para a
Broadway e atuando nos palcos como comediante.
Sua entrada direta no meio cinematográfico se deu em 1965 com o roteiro de O
que é que há gatinha?, estrelado por Peter Sellers. Já nesta obra, Allen percebeu
que não conseguiria expor sua visão se não tivesse um controle maior sobre os
filmes, atuando também como diretor. Seus primeiros esforços dentro de uma
comédia mais próxima do pastelão, com pesada influência dos geniais irmãos
Marx. Em 1977 ele atingiria um novo patamar artístisco ao lançar Annie Hall.
Allen não quis que o filme tivesse muita publicidade antes de ser lançado, para
aumentar a curiosidade do público, o que acabou dando certo. Obteve boa
presença nas bilheterias, logicamente nada comparado ao fenômeno Guerra nas
Estrelas (George Lucas, 1977) lançado no mesmo ano, mas chegou a lançar
moda, baseada no vestuário de Diane Keaton no filme, um visual meio
masculinizado com o uso de gravatas.
Annie Hall é marcante pois foi o primeiro filme considerado "típico" de Woody
Allen, com ênfase em diálogos intelectualizados e personagens mais complexos,
afastando um pouco o foco de piadas imediatas, mesmo estas ainda estando
presentes. É até hoje o filme síntese de sua carreira e talvez o melhor. O roteiro
inicial incluiria um assassinato e o mistério por trás deste crime, mas felizmente
esse desvio no enredo foi retirado e valorizou-se a comédia romântica. Indicado
pra cinco Oscars, a obra venceu os de Melhor Filme, Diretor, Atriz e Roteiro
Original. Sempre polêmico, Woody Allen não foi à festa do prêmio.
Não deixa de ser irônico que Annie Hall tenha ganho o Oscar no ano que Guerra
nas Estrelas estreou. São dois tipos de filme e dois conceitos cinematográficos
totalmente opostos, e a longo prazo foi Guerra nas Estrelas que acabou
moldando, junto com Tubarão (Steven Spielberg, 1974) a moderna indústria do
cinema, baseada no marketing selvagem e "blockbusters" descartáveis.
Prós:
- Diálogos inteligentes que podem parecer para o desatento apenas conversa
jogada fora, mas na verdade a cada frase aprendemos mais sobre os
personagens. Essa é função do diálogo, a de revelar e desenvolver caracteres.
Sempre.
- Woody Allen quebra a "quarta barreira" com eficiência, o que é algo muito
difícil de se fazer. A chamada quarta barreira é um termo originário do teatro
que marca a "fronteira invisível" entre o palco e a audiência. Logo, quando um
ator se direciona e fala diretamente aos espectadores, ele está quebrando essa
barreira. As outras três barreiras são os limites físicos e visíveis do próprio palco.
Allen chega a transportar os personagens para eventos do passado, e faz isso
parecer natural.
- A surreal e inesperada aparição do pensador Marshall McLuhan, criador do
termo "aldeia global" e um dos principais teóricos da globalização.
- Ganhou o Oscar de melhor filme mesmo sendo uma incomum comédia
romântica. Não que vencer o Oscar seja sinônimo de excelência (longe disso),
mas não deixa de ser um feito.
Contras:
- A mania dos brasileiros de mudar o nome dos filmes. O nome original é
simplesmente Annie Hall, o que dá outra dimensão ao contexto da obra, dando
destaque a personagem. O título brasileiro Noivo Neurótico, Noiva Nervosa é uma
ofensa pois o iguala a comédias descartáveis, e obviamente tem ligação com a
lógica de mercado, já que o filme fica mais "acessível" com esse terrível nome.
- É um filme que utiliza muitas referências norte-americanas, e isso às vezes
impede um melhor entendimento, diminuindo o apelo internacional da obra.
- Mesmo quebrando a quarta barreira com maestria, essas "intromissões"
prejudicam um pouco a suspensão da realidade feita pelo espectador. No início
de cada filme, a audiência procura aceitar que a obra, tanto cinematográfica
quanto qualquer outra, se prende em um mundo sólido de regras consistentes.
O rompimento da quarta barreira destrói a ilusão de que estamos assistindo
algo real.
- Algumas vezes Allen intelectualiza mais do que o necessário os diálogos, e isso
feito de forma exagerada acaba confundindo o espectador.
Devo Assistir ?
Apesar de ter vencido o Oscar de melhor filme, não é uma obra comercial. É
bem dependente de diálogos, possui cenas mais longas que a média e se
identifica mais com o norte-americano, principalmente de Nova Iorque. Porém,
suas falas inteligentes e o tema da busca incessante pelo parceiro ideal satisfaz
plenamente quem gosta de um cinema mais literário. Além disso é Woody Allen,
ou seja, sempre uma relação de amor ou ódio.
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